Superiormente acabada com uma patina exemplar e duma iconografia com uma profundidade surpreendente, assim é a pintura de Luís Vieira-Baptista, artista português de renome internacional cujas criações podem ser vistas presentemente na Galeria Rectoverso.
O homem é altivo, duma elegância refinada, a sua forma de estar denota uma rica desenvoltura pessoal e uma bela harmonia interior. A vida é para ele um bem precioso, um tesouro que venera a cada dia que passa e que honra na sua pintura. Ele, o bebé que sufocou à nascença por causa do cordão umbilical e que sobreviveu ao caso, aproveita ao máximo a beleza da existência com avidez e reconhecimento.
Assim, as suas criações são convites a uma viagem interior e levam o espectador à sua própria introspecção. De temperamento frontal e anti conformista, Luís Vieira-Baptista não se podia contentar de estar contra corrente e como se lhe impôs um vocabulário plástico fogoso, decidiu, por isso, criar o seu próprio estilo no final dos anos oitenta, o seu movimento pessoal que baptizou de “Visionismo”.
Sim, Vieira-Baptista é bem visionário e visionista. O seu mundo interior é fixado na tela por um traço seguro, uma paleta rica, um iluminismo estudado e com visões oníricas, fantasmagóricas e metafísicas.
As civilizações antigas, os rituais esquecidos, as personagens lendárias e bíblicas, os heróis mitológicos, a mulher em todo o seu esplendor sensual do seu charme, os elementos naturais e a vida aparecem-nos nas suas composições teatralizadas por efeitos de “trompe-l’oeil” e de enquadramentos telúricos.
A água, o caldo original onde a vida germina está omnipresente, assim como as forças telúricas e magmática. A areia do deserto reenvia-nos a alguns ermos solitários e ascéticos enquanto que os corpos muitas vezes relegados a fragmentos como se de mutilação de esculturas antigas se tratassem, evocam a força do amor e suas pulsações. Para alem disso há também uma forma oval que se torna recorrente. Um ovo, uma matriz, um escudo protector duma vida frágil e inocente marcam a sua atracão pela criação.
A filosofia e as religiões encontram também um eco particular no seu trabalho, como na série onde o pintor evoca a figura iniciática de Hermes Trismegisto, aquele que deverá ter vivido três vidas e que estará na origem do hermetismo, doutrina filosófica-religiosa onde se ancoram as crenças astrológicas e alquímicas.
Antes de mais, o próprio pintor é ele mesmo um verdadeiro alquimista pois metamorfoseia simples elementos figurativos, sacralizando-os e proporcionando-lhes uma grande aura espiritual. As suas criações não se despegam facilmente do espectador. Elas convidam o nosso olhar a procurar, a levantar o véu da obra bem conseguida, a penetra-la de modo a lê-la melhor e com isso a enriquecer-nos.